Artigo: DITADURA 1985-1964 CENÁRIO, ASPECTOS E ELEMENTOS DO PERÍODO DITATORIAL EM BELO JARDIM-PE.

DITADURA 1985-1964: CENÁRIO, ASPECTOS E ELEMENTOS DO PERÍODO DITATORIAL EM BELO JARDIM-PE



INTRODUÇÃO

Faz-se necessário um olhar mais amplo da discursão da temática acima citada. Compreender como se desenrolaram as tramas até o golpe militar de 1964 ,a nível nacional e regional, torna a compreensão dos reflexos nos pequenos e médios centros mais lúcida. As diversas rupturas democráticas desde a fundação da República, bem como uma análise sobre as recorrências ao autoritarismo militar dentro das quebras democrática na História do Brasil. Há de se destacar o protagonismo do Estado de Pernambuco nos acontecimentos políticos dentro da história do Brasil, destacando a importância econômica que contribuiu para transformar seu território em resistências. Apesar da opressão, violência e vigilância do Governo Central as forças de Esquerda lideradas em diversos momentos por figuras históricas como, por exemplo, Gregório Bezerra e Francisco Julião marcaram as lutas pernambucanas em períodos autoritários no Estado, resistindo em todos os espaços, ocupando as Assembleias através do voto popular quando não impedidos de disputar cargos políticos, vencendo eleições para o executivo em Recife e para Palácio Estadual nas figuras de Pelópidas Silveira e Miguel Arraes.


Todos esses acontecimentos estão interligados no tempo e no espaço, por isso a partir do entendimento dos mesmos é possível analisar os métodos usados pelos grupos Galvão e Mendonça e traçar o perfil político, econômico, social e cultural de Belo Jardim entre 1964-1985. Dentro desta narrativa mencionamos o apoio incondicional dos Poderes Executivo e Legislativo operantes naqueles idos aos Militares Golpistas de 1964. As mudanças na infraestrutura da cidade a partir de 1964 são frutos do alinhamento dos grupos políticos no poder, Cintra no Executivo e José Mendonça na Assembleia Legislativa do Estado com aporte financeiro do governo central e de órgãos como a SUDENE. Reportamo-nos também à análise de discurso registrada nas Atas das sessões da Câmara de Vereadores dentro dos 21 anos da Ditadura, atestando o alinhamento do Legislativo e Executivo para com os Militares golpistas de 1964.

Os resultados desta pesquisa expõem sua relevância histórica para nossa sociedade e para à Academia. Por que a temática sai na vanguarda que aborda o período da Ditadura Militar em Belo Jardim. Ao se debruçar sobre esta leitura o leitor mudará seus conceitos, não só sobre o mito de que a “não existiu Ditadura em Belo Jardim”, mas observará que o misticismo construído em torno dos líderes daquele período, Cintra e José Mendonça, não passou de uma construção através do processo histórico que ambos construíram de se mesmos a fim de perpetuarem suas figuras como heróis do desenvolvimentismo experimentado entre 1964-1985. 

BELO JARDIM: CIDADE COM PERFIL POLÍTICO HISTÓRICO CONSERVADOR

A história política da cidade é marcada pela polarização de grupos, desde o período dos coronéis até os dias atuais, com abrangência maior durante a Ditadura Militar onde os patriarcas José Mendonça e Cintra Galvão dominaram a cena política marcada por disputas acirradas entre os mesmos. Governaram a cidade entre 1964-1985: Júlio Alves de Lira, eleito pela coligação PSD/PTB, Francisco Cintra Galvão, eleito pelo partido da ARENA II Sebastião Lopes, eleito pela ARENA I, contudo após contendas internas do grupo político migrou durante sua gestão para a ARENA II, Fábio Galvão (ARENA II) e Valdecir Torres (ARENA II), mais tarde, após a abertura democrática, Valdecir Torres disputa eleição em 1992 já pelo MDB. Com exceção de Júlio Alves, que era remanescente das castas dos coronéis, os demais governaram sob a batuta de Cintra Galvão.

A eleição de Cintra Galvão em 1968 marcou o fim do poderio dos velhos chefes locais no comando do poder, isto é, Arnaldo Maciel e Júlio Alves de Lira. A partir de então, Cintra inaugurou um “reinado” ininterrupto que perdurou até o ano 2000. Neste período foi prefeito em duas ocasiões, líder maior do seu grupo e eleito deputado Estadual em cinco ocasiões. José Mendonça foi perfilado politicamente no grupo de Júlio Alves de Lyra, enquanto Cintra Galvão chega neste grupo apadrinhado por José Mendonça. Apesar de Arnaldo Maciel e Júlio Alves não possuírem títulos de coronéis, ambos eram descendentes dos mesmos, enquanto que José Mendonça e Cintra Galvão são oriundos das classes populares, trajetória de ambos começou depois da chegada dos militares golpistas ao poder em 1964.

OS TEMPOS DA DITADURA EM BELO JARDIM-PE: JOSÉ MENDONÇA VERSUS CINTRA GALVÃO, NEM TÃO ADVERSÁRIOS ASSIM. 

Consolidado o Golpe Militar de 1964, Belo Jardim inicia uma nova fase de sua história política, que iria refletir sobre outras áreas, pois segundo José D’Assunção Barros “não existem fatos políticos, econômicos ou sociais isolados” , ou seja, uma gama de acontecimentos interligados. 

Em 1964 o comando do Poder Executivo em Belo Jardim estava com o então prefeito Júlio Alves de Lira, eleito para ocupar o cargo entre 1964-1968 e assim permaneceu até o fim do seu mandato. Curiosamente, a partir de 1964 a alternância que ocorria desde a Revolução de 1930, que se estendeu pelo Estado Novo chegava ao fim a partir de 1964. Desde então todos os prefeitos eleitos concluiriam seus mandatos sem nenhuma interrupção. A consolidação do golpe que poderia criar uma nova alternância não se repetiu nos idos da Ditadura 1985-1964. O que confirma de que os atores políticos que lideravam a cidade estavam alinhados com o comando da derrubada da Democracia.

Porém a presença do autoritarismo, a vigília e a exaltação da “Revolução” se fizeram presente nos espaços públicos e na esfera do poder Municipal. 

As pessoas que vivenciaram o Regime Militar costumam ligar à existência da mesma a repressão violenta, para eles se não houve tortura a Ditadura passou em branco por aqui, todavia a análise dos resultados desta pesquisa confirma a existência, bem como a presença da repressão, se não violenta, mas vigilante e simbolizada em Belo Jardim.

Belo Jardim, cidade com histórico conservador não se rebelara contra os Militares Golpistas de 1964, a partir do Golpe mudaram os líderes políticos partidários, bem como a origem dos mesmos. Estamos falando de José Mendonça e Cintra Galvão. E foram justamente esses dois personagens que protagonizariam as disputas políticas dentro do Regime Militar em Belo Jardim.

JOSÉ MENDONÇA BEZERRA: POLÍTICO DA ELITE, CONSERVADOR E BRAÇO FORTE DA DITADURA EM BELO JARDIM.

José Mendonça Bezerra apesar da origem simples não lhe faltou apadrinhamento até se tornar político de carreira.  O seu casamento com uma das filhas do industrial e ex-prefeito Pedro Moura Júnior lhe rendeu apoio e capital político-social, ampliando assim suas redes de contatos com políticos de renome e poder na capital, como Lamartine Távora e o Governador Paulo Guerra. Logo, se compreende os caminhos percorridos por José Mendonça até seu primeiro mandato para Deputado Estadual em 1966. José Mendonça foi um político da elite, de acordo com José Adilson Filho:

“De perfil menos carismático do que Cintra Galvão, a imagem de José Mendonça é construída pelos adversários como a de uma liderança “carrancuda” e “autoritária”, sendo sua relação com as camadas populares marcada pela distância. ” 

Representante da ARENA I em Belo jardim, já firmado como um político conservador, elitista buscou também através dos seus cargos para ampliar os negócios da família através da influência que o cargo de Deputado lhe oferecera. Os periódicos da capital vez ou outra publicava notícias referentes ao trabalho desenvolvido por José Mendonça em busca de crédito para as empresas da família, sobretudo a do cunhado Edson Mororó Moura. Crédito esse oriundo da SUDENE. As empresas da família chefiada por Edson Mororó Moura, as Baterias Moura, viria a ser seu aporte financeiro pra disputas políticas a nível Municipal e Estadual. O periódico recifense se refere a José Mendonça como “o candidato das Baterias Moura” .

A partir de 1966 quando eleito Deputado pela primeira vez viria a tornar-se  um dos homens mais influentes do Estado. Dentro do regime militar não obteve nenhuma vitória na disputa pelo Executivo Municipal. José Mendonça pode-se dizer que é cria direta do Golpe Militar, como corretor de imóveis do governador Paulo Guerra a partir da derrubada de Arraes, foi investido da missão de monitorar Belo Jardim. Fez carreira na política, construiu alianças e principalmente foi um dos responsáveis pela decolagem da principal empresa da sua família, a Moura.

 CINTRA GALVÃO: POLÍTICO DO POVO, POPULISTA E BRAÇO FORTE DA DITADURA EM BELO JARDIM

Francisco Cintra Galvão, depois de alcançar seu primeiro mandato em 1969, Cintra se afasta de José Mendonça, seu mentor político, e a partir daí projeta-se como líder em um novo grupo com um perfil político oposto daquele que seria adversário político, pelo menos nas disputas municipais. Cintra Galvão construiu uma imagem contraria ao seu adversário, José Mendonça, sempre se mostrou solidário as camadas populares da cidade, afirma José Adilson Filho: 

“O estilo paternalista na maneira de tratar as pessoas rendeu-lhe a amizade e a admiração de vários seguimentos das camadas populares. Consolidando para seus aliados a figura do Moisés, isto é, de um comandante imprescindível que “protege” e “acolhe” o povo da “violência” e da ganância” de seus adversários, mas que também os conduz ao progresso e a felicidade”  .

A popularidade de Cintra Galvão lhe renderam cinco mandatos na Assembleia Legislativa do Estado, tendo início essa trajetória política no ápice da Ditadura Militar. Para José Adilson Filho “como prefeito eleito pela Arena, mostrou fidelidade a Ditadura Militar, ambos disputavam a amizade e o prestígio de figuras como Marco Maciel e Roberto Magalhães”  . Eleito a primeira vez como prefeito de Belo Jardim no ano de 1969 pela Arena II, apoiou o golpe militar em todas as esferas, inclusive com festas comemorativas de aniversário do golpe. Conforme José Adilson Filho: 

“O apoio aos militares deu-se também através de festas comemorativas, como bem demonstra a lei No 31/69 que decretava um crédito de NCR$ 1.200,00 (mil e duzentos cruzeiros novos) para atender as despesas com as festividades do quinto aniversário da Revolução de 31 de Março de 1964” .

Cintra vestiu a capa do populismo como disfarce para entrar para a história não como um fiel escudeiro dos militares golpistas, mas como um líder das massas, o pai dos pobres da história de Belo Jardim. Até dos dias atuais Cintra usa e abusa do discurso populista, omitindo assim seu apoio total aos militares golpistas de 1964.

 A VIOLÊNCIA SIMBÓLICA DOS ÓRGÃOS REPRESSORES DO REGIME MILITAR EM BELO JARDIM

Cintra Galvão foi prefeito duas ocasiões, a primeira vez entre 1969-1973, e na segunda oportunidade no período de 1989 a 1992, e em outros pleitos como líder do seu grupo político conseguiu eleger seus apadrinhados políticos, a exemplo do seu sobrinho Fábio Galvão (1977-1981), eleito pela ARENA II, para o mandato. Fábio Galvão em entrevista para a construção desta pesquisa afirma de forma risonha “Eu era da ARENA sim, mas era bonzinho”  . A música da campanha de Fábio Galvão denuncia o partido do qual fazia parte seu grupo político liderado por seu tio Cintra Galvão: 

Arena dois chegou, com uma renovação / É Valdeci pra vice e o prefeito é Fábio Galvão / É ele, é Fábio, o povo tem razão / É Fábio é ele, é Fábio Galvão .

O período governado por Fábio Galvão, sobrinho de Cintra, é compreendido como uma extensão do que seu tio vinha desenvolvendo em termos de infraestrutura para a cidade, contudo é também neste governo que percebemos as moedas de troca entre poder local e central, ou seja, o apoio ao governo ditatorial em trocas de benesses, conforme cita Adauto Guedes Neto:

Através das atividades políticas e atuação partidária analisada, percebemos características que se assemelham às praticadas pelo governo militar na cidade, seja através da ideia do desenvolvimentismo, associada ao crescimento econômico do país, seja através de um estilo conservador e truculento de administra a cidade e fazer política. 

Fábio Galvão foi ator central de um episódio que mais uma vez confirma a constante vigilância das autoridades militares em Belo Jardim, quando o mesmo recebeu ordens do Comando Supremo do Exército para exonerar o então presidente da Autarquia Municipal de Belo Jardim sob suspeitas de “práticas comunistas”, sobre esse fato Fábio Galvão nos relatou “Isso aconteceu, isso foi coisas dos Mendonças ” , levantando assim as suspeitas do Exército, resultando na ordem imediata de exoneração. O documento que comprova a fala do entrevistado encontra-se no arquivo do DOPS na cidade de Recife. Mais um fato que contribui para afirmar de forma categórica a vigilância dos Militares para com as cidades interioranas, neste caso, Belo Jardim, ou seja, estavam atentos a qualquer ato por mais que este não ameaçasse sua autonomia nestes micros espaços, o apoio dos líderes municipais não os faziam relaxar quanto a vigília.

Hoje é possível compreender as estratégias dos grupos liderados por José Mendonça e Cintra Galvão para preservar suas respectivas lideranças a nível Municipal e Estadual nos idos da Ditadura. Sim, eram adversários ferrenhos dentro do espaço que corresponde à cidade de Belo Jardim, porém alinhados e parte importante para a consolidação da Ditadura na cidade, sobre isso Adilson Filho afirma “Embora José Mendonça e Cintra Galvão divergissem no plano interno, faziam parte do bloco aliado ao Regime Militar que se instaurou em 1964”  ·. Os patriarcas e líderes políticos Cintra Galvão e José Mendonça sempre ocultaram os laços que os uniram, a aliança com a Ditadura Militar, no plano municipal sempre usaram seus discursos para se fizerem passar por adversários, contudo ambos se mantiveram em lados iguais no plano nacional, o jogo de inimigos políticos fazia parte de um script a ser seguido, talvez como obstáculo para o impedimento de novas lideranças que não fossem os mesmos.

Muitas foram às demonstrações, acenos e simpatia de ambos aDitadura Militar, não só como apoiadores dos soldados do golpe. Ambos foram anfitriões dos representantes da Ditadura em Belo Jardim, e este posicionamento lhes renderam capital político as suas famílias, o qual se estende aos dias atuais, porém a maior herança desse período herdada por ambos é o que Daniel Aarão diz “A cultura política autoritária, cuja vitalidade ninguém pode contestar tantos anos depois de fechado o período da ditadura militar”.

O MILAGRE ECONÔMICO EM BELO JARDIM: O RESPINGO DO GOLPE

A década de 1970 foi à coroação do Regime Militar em termos econômicos, por este motivo recebeu o nome de “O Milagre Econômico.Nesta fase acentuou-se o aumento das desigualdades sociais como reflexo da alta concentração da renda, bem como os níveis alarmantes de inflação na casa dos dois dígitos. O Milagre Econômico custou ao Brasil além de uma dívida externa, também grandes consequências para as próximas décadas, que se agravaria na década de 1980, conforme Daniel Aarão: 

“Neste país formou-se uma pirâmide social de distorções, em que concentração de renda e de poder chamava a atenção do observador mais desatento. E certo que o topo já enriquecido, enriqueceu-se ainda mais. e a base miserável mais miserável se tornou” 

O herdeiro do Milagre Econômico é a Década Perdida (1980), do ponto de vista econômico e social.

A grande euforia do Milagre Econômico atingiu Belo Jardim, e nesse período, imbuídos pelo slogan “Ninguém segura esse país”, a cidade passa por grandes transformações em diversas áreas. Belo Jardim começou a ser irrigado por recursos logo no alvorecer da Ditadura Militar, isso fica perceptível já no governo de Júlio Alves (1964-1968), com obras de infraestrutura que mudaria o aspecto rural da cidade, como alargamento de ruas, praças e hospitais. O despejo de recursos tem continuidade no primeiro governo de Cintra Galvão (1969-1973) com mais investimento em infraestrutura, ampliação da Rede Municipal de Ensino, inauguração da Escola Agrotécnica Federal  e melhorias no sistema de saúde e o considerado por todos e o grande feito de seu primeiro mandato, isto é, a criação do Primeiro Distrito Industrial às margens da BR 232, a Central de Abastecimento, Colégio Frei Cassiano de Comacchio. 

No governo foi de Sebastião Lopes (1973-1977) teve procedimento as obras de infraestrutura na cidade e na zona rural, inaugurou a FABEJA, foi no seu governo que a Palmeiron e MAFISA foram inauguradas e instaladas no Primeiro Distrito Industrial. 

Seu sucessor foi José Fábio Galvão (1977-1981), sobrinho de Cintra, administração que ficou pra história tradicional e na memória do povo como gestão   marcada pelo dinamismo administrativo em setores de saúde, educação, infraestrutura. 

Em 13 de Setembro de 1978 em edição especial o Diario de Pernambuco  dá ênfase ao cinquentenário de Belo Jardim, elencando as diversas obras inauguradas nesta década: A criação planejada do Bairro da Cohab I, o Centro Social Urbano, as obras da Barragem do Bitury,a implantação de industrias como a Palmeiron e Mafisa conforme acima citado, bem como a Central de Abastecimento e o Colégio Agrícola, conforme o jornal “ Cresce em ritmo acelerado, aproveitando bem sua vocação natural, através da implantação de novas industrias. Um progresso embasado igualmente num sistema educacional planejado” .Todas essas benfeitorias não por coincidência nem tão pouco vocação industrial da cidade, embora não podemos desprezar fatores que as facilitaram, mas é evidente que  o apoio dos grupos políticos da cidade a Ditadura resultou no sucesso do Milagre Econômico na cidade.

  E por fim, o último prefeito da “Era Militar” em Belo Jardim, mais um apadrinhado de Cintra Galvão, Valdecir Rodrigues Torres (1982-1988), sua administração foi à continuação do desenvolvimento no quesito infraestrutura, sobretudo na área urbana. Evidentemente que todas essas benfeitorias são fruto da recompensa dada pelos governos militares a conivência dos líderes políticos locais, conforme Adauto Neto: 

“Mas, sobretudo, percebemos que o aparato militar tinha seus representantes nas diferentes regiões do país, representados pela ARENA ou, posteriormente, pelo PDS, e os mesmos eram recompensados com diferentes formas de benefícios. O apoio tratava-se de obras públicas que eram encaminhadas à cidade, onde eram utilizadas para promover o poder executivo municipal e contribuíam par neutralizar quaisquer reações da população contra a administração local e cristalizar o discurso do desenvolvimentismo” 

. O elo entre Belo Jardim e os Militares se dava através de José Mendonça e Cintra Galvão em duas esferas, Municipal e Estadual, uma vez que José Mendonça ocupou o cargo de Deputado Estadual nesse período.

Para Adauto Guedes:

Conseguir recursos para a cidade e construir obras, tais como escolas, postos de saúde, praças, dentre outras, era necessário para que as práticas de perfil opressão não se tornassem evidentes, tendo em vista que o poder não se mantém apenas por prática de violência, mas, sobretudo, na troca de favores, no dar e receber, numa espécie de violência simbólica .

Durante este período, não apenas a cidade passou por um destacado crescimento, mas também as empresas das famílias Mendonça e Galvão,  segundo José Adilson Filho:

“A proeminência de José Mendonça Bezerra e de Edson Mororó Moura nas atividades político-econômicas locais ocorrera não apenas como fruto de seus talentos individuais, mas também como consequência dos compromissos assumidos com o Regime Militar”

As contradições geradas pelo Milagre a nível nacional também se fizeram presente em Belo Jardim, o acesso aos novos meios de produção através das fábricas recém-instaladas no Primeiro Distrito Industrial e Instituições Educacionais estavam disponíveis para uma pequena parcela da sociedade da época. Neste período a cidade estava abarcada com uma grande massa de moradores recém-chegados do campo, que se instalaram em localidades distante do Centro em condições precárias de sobrevivência. Foi neste cenário da década de 1970 que muitos migraram para o Centro Sul do País. O desenvolvimentismo gerado a partir do apoio a Ditadura favoreceu os líderes dos grupos políticos que se firmaram como construtores do progresso, ficando ocultadas assim suas alianças com o Militares golpistas de 1964-1985. 

A SUDENE A SERVIÇO DOS PATRIARCAS 

Apesar de não ter sido criada durante a Ditadura Militar, 1964-1985, a SUDENE (1959) desempenhou um papel fundamental para que os militares fortalecessem seus vínculos para com os políticos que não lhes ofereciam resistência. A SUDENE foi enfraquecida devido a seus objetivos terem sido redirecionados em favor das causas das elites rurais e oligárquicas. 

Esse órgão aparece na história de Belo Jardim-PE no período em tela sempre atrelada aos interesses dos grupos políticos de José Mendonça e Cintra Galvão, foi com o incentivo financeiro da mesma que ambos os líderes passaram a desempenhar ações políticas a empresariais, surgindo assim os primeiros empreendimentos destes políticos irrigados com recursos da SUDENE, a exemplo da fábrica Moura, Belasa pertencentes à família do então na época Deputado José Mendonça Bezerra e indústria no ramo da construção como as Cerâmicas de Cintra Galvão.

Os recursos adquiridos através da SUDENE pelos líderes políticos de Belo Jardim nesse período foram apenas uma das moedas de troca repassada aos mesmos como agradecimento pelo apoio, hospitalidade e conveniência dada aos militares. As empresas dos mesmos nunca vingaram com exceção da fábrica Moura que não foi administrada diretamente pelo grupo Mendonça, mas por seu cunhado, Edson Mororó Moura. Empresas que no plano municipal ficaram famosas pelas inúmeras vezes que decretaram falência.

AS FONTES: CONFIRMAÇÃO DA SUBSERVIÊNCIA DOS PODERES EXECUTIVO E LEGISLATIVO PARA COM A DITADURA

Belo Jardim, cidade que teve em seu processo de formação o catolicismo e o coronelismo como peças fundamentais para a construção do imaginário do seu povo. O período Militar veio reforçar este comportamento predominantemente conservador, uma sociedade com aversão às mudanças.

Podemos perceber a presença do autoritarismo, conservadorismo e a submissão a Ditadura Militar em diversas falas e ações promovidas pelo Poder Executivo e Legislativo a Ditadura, durante a vigência dos militares frente ao poder nos 21 anos em que governaram este país. A base da construção do pensamento da sociedade belojardinense não se construiu diferente do que se fez a Nação, ou seja, uma sociedade patriarcal, elitista, católica e moldada segundo os critérios do clientelismo e mandonismo.

Desde os tempos dos coronéis o poder público em Belo Jardim se manifesta como agente que preserva a memória de tempos autoritários. Podemos perceber essa prática através da nomeação de Avenidas, Ruas e Praças intituladas com nomes que nos remete aos personagens de cunho autoritário a nível Estadual como Agamenon Magalhães e Paulo Guerra, bem como os personagens locais que marcaram a fase da República Velha, isto é, os coronéis e os atores políticos que governaram durante o Estado Novo. Mas, o apoio e submissão aos Militares não se restringia apenas a singelas homenagens a personagens antidemocráticos. Por diversas ocasiões durante os 21 anos de Ditadura o Poder Público Municipal também fez uso das Instituições Municipais através da Prefeitura e da Casa Legislativa para externar sua satisfação para com a Ditadura Militar.

Os atos a que vem atestar essas práticas estão registradas em documentos oficiais, a principal são as Atas da Câmara de Vereadores da cidade. A leitura destas Atas nos permitiu fazer uma análise de discurso dos atores políticos que passaram pela Casa Custódio Ferreira Mergulhão, onde os mesmos, bem como prefeitos e autoridades municipais fizeram uso da Tribuna para apoiar, exaltar e enaltecer a Ditadura Militar e suas lideranças. 

No momento em que o Golpe Militar de 1964 foi consolidado o cenário político belo-jardinense tinha como prefeito Júlio Alves de Lira, a formação do legislativo segundo consta nas atas da Câmara com a seguinte composição: Custódio Ferreira Mergulhão, Presidente da Casa, José Batista dos Santos Aluísio Clemente de Souza, Luiz Feliz de Araújo, Maria das Mercês Oliveira e José Ramos da Silva. Há uma lacuna entre os meses que antecederam o Golpe e após o mesmo, por exemplo, a primeira sessão registrada em Ata depois de derrubada da Democracia consta de 22 de junho de 1964, ou seja, três meses, pois não  consta no arquivo da Câmara no qual pesquisamos.  

A primeira Ata que faz menção saudando o movimento golpista que derrubou João Goulart é a Ata registrada em março de 1969, quando o poder Legislativo realiza sessão solene para comemorar os cinco anos do que chamavam de “Aniversário da Revolução”, a sessão conta com a participação de diversas autoridades, além dos vereadores também se fizeram presentes membros do Exército, professores, comerciantes, representantes do Executivo e civis que ocupavam as galerias do recinto. Segundo consta na Ata daquele dia “O primeiro orador a usar a palavra foi o vereador João Torres Cordeiro, que registrou o período de desordem, reinante no Brasil, antes de Revolução de 31 de março”, um discurso afiado com as forças conservadoras que justificando sempre “a desordem” como motivo para derrubar um presidente eleito democraticamente.

As sessões com esse propósito se repetiram diversas vezes ao longo dos 21 anos de Governo Militar, as Atas registram a satisfação dos Poderes Executivo e Legislativo em apreciar os aniversários do Golpe, porém em 24 de julho de 1967 consta em Ata a comunicação em forma de ofício do então Prefeito Júlio Alves conclamando o Legislativo a participar da realização de uma missa na Matriz da Conceição local em sufrágio da alma do ex-presidente da República Marechal Castelo Branco ,este morto em acidente aéreo. Nesta mesma sessão o plenário da Câmara, o então vereador Airton Maciel:

“Propôs para constar da ata um voto de repúdio ao jornalista Hélio Fernandes pela atitude tomada em relação ao ex-presidente Castelo Branco e que se comunique ao comando do quarto Exército, o que se faz pela aceitação unanime do plenário”  .

Hélio Fernandez foi um dos jornalistas mais perseguido e preso antes e durante a Ditadura Militar, crítico fervoroso do Regime o mesmo usou o jornal de sua propriedade, “Tribuna da Imprensa” no dia 19 de julho de 1967 para externar sua satisfação com a morte do primeiro presidente Militar.

Hélio Fernandez pagou um preço alto por expressar sua opinião, foi preso, a repercussão foi grande tendo o repúdio as suas declarações chegado a Belo Jardim. De acordo com a análise das atas percebe-se que os acontecimentos a nível nacional não passaram despercebidos principalmente pelos atores políticos que compunha o cenário político da cidade, ou seja, o poder Legislativo acompanhava de perto cada acontecimento a nível nacional e fazia questão de registrar apoio ou repúdio aos mesmos, sempre se alinhando aos Militares.

Já nos idos de 10 de outubro de 1968 consta na Ata um projeto de lei que objetivava a mudança de nome das Praças por nomes de personagens de destaque da Ditadura Militar, bem como de aliados do mesmo, não importando a nacionalidade dos próprios, todavia a proposta apresentada no projeto foi rejeitada pelo plenário da Câmara, assim consta registrado na Ata: “Projeto substituindo as denominações das praças D. Luiz e Fernando de Abreu para Alencar Castelo Branco e Irmãos Kennedy, respectivamente, foi rejeitado por unanimidade” . 

O discurso moralista de anticorrupção no qual se embasaram os setores que organizaram a tomada do poder em 1964 se fez presente também na Casa Custódio Ferreira Mergulhão através da fala dos Arenistas Geraldo Gomes dos Passos e Eduardo Gomes de Araújo: 

O momento político administrativo quando o governo do excelentíssimo Marechal Costa e Silva, em coesão completa com as Forças Armadas, vão erradicar a corrupção setorial e mais vícios de uma política-administrativa, até ontem antes do Ato Institucional N 5, tendente completamente a irresponsabilidade com a coisa púbica .

O nono aniversário da Revolução foi o segundo a ser comemorado pelos poderes Executivo e Legislativo, a sessão que tratou de homenagear a data foi marcada pelos discursos que reforçavam a importância da chamada Revolução. O então vice-prefeito Eduardo Gomes de Araújo na presença do prefeito Cintra Galvão proferiu conforme conta na Ata as seguintes palavras “os tempos analegam os bons trabalhos da Revolução. E que o movimento de 31 de março é significante para o nosso povo” .

Durante os anos do governo dos Militares o nacionalismo foi exaltado e datas como a Independência foi mais uma oportunidade para reforçar o espírito patriótico alimentado pelos militares, em 1972 mais uma vez Câmara e Prefeitura organizaram sessão solene para enaltecer o papel dos militares bem como os símbolos nacionais em presença de autoridade do Exército como o Tenente José Eduardo Cavalcante Bernardo que: “Faz questão de citar a valiosa a contribuição que o Exército vem prestando” . É notório que o uso da retórica em defesa dos militares não se restringia apenas a datas simbólicas, em algumas ocasiões a Câmara proferiu palestras sobre a temática ligada a “Revolução” convidando para o ato diversos palestrantes sempre elencando os pontos positivos da Ditadura Militar, bem como consta nas atas sempre elogios aos presidentes militares.

Em uma sessão solene onde se comemorou os 12 anos da “Revolução” convidou-se para palestra um Professor de nome Elny Sampaio onde o mesmo justificou as causas da tomada do poder pelos militares, negando a forma violenta que derrubou a democracia. Percebe-se o esforço do Legislativo em encontrar meios de externar seu apoio aos militares. Os Vereadores cumpriram o papel de agentes da repressão, não praticando violência física, mas reforçando o discurso de que o período 1964-1985 foi benéfico para a Nação, bem como para a cidade. 

Os poderes Executivo e Legislativo da cidade estiveram alinhados aos militares durante a vigência da Ditadura. A Câmara Municipal foi o parlatório dos atores políticos que compuseram o cenário político da cidade. A satisfação bem como o apoio aos rumos do País dado aos militares se faz presente no registro das atas e em atos públicos de caráter inaugural, lá estava um militar fardado ao lado dos políticos e do Clero da cidade. 

O apoio a Ditadura Militar não se restringia apenas a retórica registrada em Atas, mas na presença de figuras do Exército dentro da Câmara e em solenidades do Executivo. Os resquícios dessas práticas são observados até dos dias atuais, igualmente a bipolarização política dos patriarcas das famílias Mendonça e Galvão. De 1966 até a abertura democrática, Cintra Galvão e José Mendonça encenaram um teatro que por décadas convenceu o povo de que eram inimigos, mas na verdade possuíam afinidades políticas, estavam do mesmo lado quando as cortinas dos palanques eram fechadas e os mesmos dividiam esse espaço, “dançavam no mesmo baile” desnudos do rótulo de elitista e populista, disputando apenas quem mais servia aos interesses da Ditadura Militar em Belo Jardim.


Texto : 

Cibele Santos ( Esp. HISTÓRIA- AEB)

E. S. B  ( Esp. HISTÓRIA-AEB) 



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